PLP que regulamenta trabalho de motoristas de aplicativos é histórico

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01 de abril 2024

A indústria das fake news não dá trégua em seu propósito de manipular a classe trabalhadora para que acredite que iniciativas, projetos e lutas por direitos prejudicam trabalhadores.

Fruto de uma negociação conjunta entre governo, plataformas que gerenciam aplicativos de transportes de passageiros e os representantes dos próprios trabalhadores foi o PLC (Projeto de Lei Complementar) que regulamenta as relações de trabalho entre os motoristas de transporte particular de passageiros e as plataformas.

Ao contrário do que se propaga no submundo das redes sociais - argumentos falsos de ataque ao projeto - a proposta de regulamentação já é considerada histórica por ser uma negociação de tal magnitude e que envolve todos os setores.

Esse é o posicionamento dos representantes dos trabalhadores do setor, que participaram das negociações que resultaram no PLC. A presidenta do Simtrapli-RS (Sindicato dos Motoristas em Transportes Privados por Aplicativos do Rio Grande do Sul), Carina Trindade, afirmou ao portal da CUT que ‘há uma turma politizando o debate sobre o projeto e deixando os trabalhadores confusos a respeito da proposta”, se referindo às investidas contra todas as formas de organização da Classe Trabalhadora.

Um dos pontos mais usados como prerrogativa para atacar o projeto é a questão da contribuição previdenciária. Nesse tema, opositores promovem ‘uma verdadeira bagunça’ nas informações, fazendo trabalhadores acreditarem que tal contribuição será maior do que a prevista no texto.

Por si só, a inclusão da proteção social no projeto, diz Carina, já é um avanço sem precedentes. Ela exemplifica citando os inúmeros casos de motoristas que tiveram de se afastar do trabalho por acidentes, por serem vítimas de algum tipo de violência como assaltos e até mesmo, no caso das mulheres, quando estão grávidas e teriam de se afastar para ter o bebê.

“É preciso ter em mente que há pessoas que pararam de trabalhar porque sofreram algum acidente, ficaram sem renda e hoje dependem de ajuda da família, de amigos, até com vaquinhas, para poderem sobreviver. Pagar a previdência faz com que esse trabalhador e essa trabalhadora possam ter um benefício para, minimamente, se manterem enquanto se recuperam. É o mínimo de dignidade que um ser humano deve ter”, diz Carina Trindade.

E ela desmente as afirmativas de que o trabalhador passará a pagar um montante de 27,5% sobre sua renda total. “A contribuição não funcionará dessa maneira. É preciso entender como foi feita a divisão da contribuição na renda, que tem base no que é rendimento e no que é benefício”, ela diz.

Para isso, é necessário entender que, em primeiro lugar, o projeto estabelece um piso nacional para o setor. O valor definido de R$ 32,10 se refere à soma do que é custo e do que é rendimento, sendo R$ 8,03 de renda mínima para o motorista, e R$ 24,07 de custo com combustível, manutenção, internet e outros.

A contribuição, destaca a dirigente, será sobre os R$ 8,03. “O trabalhador pagará 7,5%. A plataforma pagará 20%. Essa é a proposta. Isso é o que está no projeto”, esclarece Carina Trindade.

Ela reforça ainda que se a plataforma descontar mais do que previsto, será penalizada. E é nesse momento, justamente, que entra a atuação da representação dos trabalhadores, defendendo e acionando as plataformas. Essa representação é algo histórico não havia até agora. “Era cada um por si”, complementa a dirigente.

“Sabemos que as elites, os empresários e os governos passados atuaram de forma a fazer com que o trabalhador criminalize o movimento sindical. Tal foi o nível de alienação que hoje há trabalhador que diz que sindicato não o representa, sem ter a menor noção ou informação da importância que teve historicamente e tem até hoje o movimento sindical em sua vida”, afirma a presidente do Simtrapli-RS.

Ela se refere a pontos como a defesa de direitos, as negociações coletivas exitosas, a proteção ao trabalhador sindicalizado quando é demitido de uma empresa e precisa de assistência jurídica, entre vários outros fatores.

“Trabalhadores têm de abrir os olhos para o quanto tentam enganá-lo. E basta analisar a realidade. O movimento sindical, os representantes dos trabalhadores foram atacados, mas sindicatos patronais se fortaleceram ainda mais. É preciso ter consciência de classe, saber a qual lugar pertencemos e lutarmos por nossos direitos”, pontua Carina Trindade.

Conheça o projeto que define direitos para a categoria

Projeto garante o mínimo, o que não havia antes

No território das redes sociais, o enfrentamento às fake news vêm sendo reforçado para conscientizar trabalhadores sobre o que representa o projeto à categoria.

Um vídeo produzido pela CUT circula no Instagram, X (ex-Twitter) e Facebook, além das Brigadas Digitais, mostrando ponto a ponto, o porquê de o projeto ser uma ferramenta de luta por direitos.

Entre eles, o poder de negociação com as plataformas, o piso de remuneração, a contribuição previdenciária, entre outros.

Veja abaixo a publicação:

Fake news

Em sua avaliação sobre o cenário de ataques dos setores conservadores e da extrema direita ao projeto, Carina afirma que, reflexo de uma dominação ideológica por meio das redes sociais, “as pessoas tendem a tomar qualquer tipo de informação como realidade. Mas elas têm que ler o PLC, têm que conversar com quem realmente conhece, que participou do processo de negociação, para formar sua opinião”.

“Não é aceitável ouvir, por exemplo, influencers digitais, financiados para defender interesses desses setores contrários. Não dá para deixar outra pessoa decidir por você”, ela alerta.

Ainda em tom de crítica e reflexão, Carina conta que já conversou com trabalhadores que se prestaram a atacar o projeto, sem conhecê-lo.

”Já teve motorista que veio com fake news e eu perguntei ‘você leu o projeto?’ Ele disse ‘não, mas o ‘fulano’ falou”, relatou a dirigente explicando que antes de formar a opinião a respeito do assunto é, ao menos, justo, ler o conteúdo. “Depois, se ele quiser ser contra ou a favor, é com ele, mas não se pode simplesmente acreditar em oportunistas, tampouco em correntes de WhatsApp”, finaliza a dirigente.

Opinião

De Gravataí, no Rio Grande do Sul, Lucas da Costa de Lima, que também é professor de história, expressa ‘decepção’ com o movimento de fake news para desqualificar o PLC.

“O projeto é um pontapé inicial, algo que não foi nos oportunizado nos quatro anos de governo do ‘inominável’. Fico admirado em ver gente ainda defendo o ex-presidente, e contra nós mesmos”, ele diz.

Em seu ponto de vista, Lucas observa que se a categoria se mantém na ilegalidade, como querem os opositores, as empresas poderão continuar cobrando o que quiserem sobre os ganhos dos trabalhadores.

“Tem momentos que o desconto chega até 60%. As duas principais chegam a cobrar isso - de 40% a 60%. Regulamentando, a gente existindo como categoria, será possível reivindicar mais direitos como qualquer outra categoria, como bancários, médicos, as domésticas que também passaram anos sem existir perante a lei”, ele diz.

Ele reforça que o projeto é um ponto de partida e que surgiu após o país ter um governo democrático e popular. “Agora é melhorar o projeto, dar suporte, propor. Os sindicatos sempre pressionaram. Desde que surgiu o primeiro APP, o Uber, diversos colegas fizeram de tudo para nos defender, para sermos ouvidos, mas só agora isso aconteceu”, finaliza Lucas.

Por André Accarini, com edição de Paula Brandão/CUT Nacional