Mulheres jovens e negras são as mais afetadas pelo desemprego e a informalidade
15 de maio 2024
Em 2023, a taxa de
desemprego para jovens mulheres negras (faixa etária entre 18 e 24 anos) era de
18,3%, três vezes maior que o percentual de homens brancos (5,1%) fora do
mercado de trabalho. O alerta é do relatório “Mude
com Elas”, do projeto homônimo conduzido pela ONG Ação Educativa,
com base na PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua),
divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O trabalho ressalta que, no final de 2023, o país contava com 8,1 milhão de
pessoas desocupadas, ou cerca de 7,4% das pessoas com idade de trabalhar. “O
número é o menor desde 2014, mas, a partir do recorte da ONG, revela que as
jovens e negras seguem sendo as mais prejudicadas no mercado de trabalho, e
isso é reflexo de questões históricas racistas e machistas”, observa a
secretária da Mulher da Contraf-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores do
Ramo Financeiro), Fernanda Lopes. “Isso fica evidente, quando analisamos
que, mesmo com o mesmo
grau de escolaridade e exercendo a mesma função dos homens,
elas ainda têm remuneração menor do que seus pares masculinos”, completa.
Outros dados levantados pela entidade mostram ainda que:
– A taxa de
informalidade é maior entre as jovens e negras: 42% do grupo, 9 pontos
percentuais (p.p.) a mais em relação às mulheres jovens brancas (33%);
– A renda delas (R$ 1.582,00) é 47% menor que a média da
população (R$ 2.982,00) e 2,7 vezes menor que dos homens brancos (R$ 4.270,00);
– Enquanto apenas 44% delas têm carteira assinada, esse número
passa de 50% no caso de homens brancos;
– O acesso ao ensino superior é menor entre as mulheres jovens
e negras: 3,4% desse perfil frequenta ou já terminou uma graduação. Enquanto o
percentual de mulheres brancas na mesma situação é 39,8%;
– No grupo de pessoas de 14 a 29 anos, 10,6% das mulheres negras trabalham
e estudam, enquanto 23,3% estão fora do mercado de trabalho e, ao mesmo
tempo, não estudam. Por outro lado, entre as mulheres brancas na mesma faixa
etária, 15,4% trabalham e estudam e 15,4% estão fora do mercado de trabalho e
não estudam.
– Horas em fazeres domésticos: jovens e negras se dedicam, em
média, 22 horas semanais, comparado à média de homens negros e brancos (11,7
horas).
O secretário de Combate ao Racismo da Contraf-CUT, Almir Aguiar, reforça que a
população negra, em idade ativa, é a mais afetada pelo desemprego, mesmo diante
da melhora do mercado de trabalho, observado no primeiro ano (2023) do terceiro
mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Apesar de sermos 56,1% da população em idade de trabalhar, em 2023, os negros
correspondiam a mais da metade dos desocupados (65,1%). A taxa de desocupação
dos negros era, na ocasião, de 9,5%, sendo 3,2 pontos percentuais acima da taxa
dos não negros”, disse com base em levantamento do Dieese (Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), também realizado a
partir da PNAD.
No relatório “Mude com Elas”, a ONG Ação Educativa, ressalta também que “os
jovens são o seguimento com menos acesso ao trabalho com carteira assinada”,
sendo que “menos de 40,4% têm contrato de CLT com menos de um ano”. Porém, com
o recorte feito no levantamento da entidade, é possível confirmar o diagnóstico
de que a discriminação é mais aprofundada no mercado de trabalho às mulheres
jovens e negras.
Em depoimento para o
site Universa, Emily Santos de Lima, de 18 anos, contou que
frequentemente é questionada sobre seu cabelo, nas entrevistas de emprego.
“Querendo ou não, ninguém fala sobre o cabelo de pessoas que têm os fios lisos.
Mas uma pessoa de cabelo afro grande, mostrando o cabelão, a gente recebe
comentários. Já ouvi coisas como ‘mas você quer que cresça mais?’, referindo-se
ao cabelo”.
Para mudar o cenário
A partir desse
diagnóstico do relatório, a ONG Ação Educativa aponta como estratégia a
construção de políticas públicas que priorizem jovens mulheres. A entidade cita
como exemplo de ação política já em curso o Plano de Ação do Pacto Nacional de
Prevenção aos Feminicídios, de articulação do Ministério das Mulheres, com
medidas para prevenir formas de discriminação, misoginia e violência de gênero
contra mulheres e meninas. Mas a organização reflete que é preciso o
envolvimento de todos os setores, principalmente de empresas para haver uma
mudança real.
“É urgente o empoderamento dessas mulheres, e esse compromisso só será efetivo
por meio de políticas públicas efetivas e pelo comprometimento com o real
propósito da transformação”, explica a coordenadora do projeto Mude com Elas,
Fernanda Nascimento. “A desigualdade é um fenômeno que infelizmente aparece nos
mais diversos aspectos da sociedade brasileira, nas questões jurídicas,
econômicas e no mercado de trabalho”, completou.
A secretária da
Juventude da Contraf-CUT, Bianca Garbelini, avalia que é preciso investimentos
robustos na educação pública. “Esses investimentos são necessários para o
estabelecimento de mais políticas afirmativas voltadas às jovens negras, para
que elas possam acessar a Universidade”, defendeu.
“Para além disso, precisamos entender que há uma intersecção entre a questão do
trabalho de cuidados e a realidade apresentada, de que entre essas jovens há
uma proporção maior das que não estudam e ao mesmo tempo não trabalham. Ou
seja, o volume de jovens negras nesta situação tem relação com a
responsabilidade maior que recai sobre elas, no cuidando de seus familiares,
sejam irmãos mais novos, filhos ou idosos. Portanto, a socialização do cuidado
como política pública é fundamental”, completou.
Fonte: Contraf-CUT