Misoginia, assédio sexual e moral fazem parte da realidade das mulheres no trabalho
20 de março 2024
Foto: Roberto Parizotti (Sapão)
O mês de março dedicado às mulheres em que muitos ainda acreditam que basta dar flores e bombons no 8 de março para se redimirem das suas atitudes no dia a dia, em que as colocam em posição de inferioridade intelectual, as desestimulam a crescer profissionalmente e delegam a elas as tarefas domésticas, é muito mais do que receber presentes. É época de luta por igualdade, direitos e justiça.
O Fórum das Mulheres, do qual a CUT faz parte, elencou três os focos de combate à violência: “Educação Sem Violência de Gênero: pela promoção de uma sociedade livre de discriminação de gênero e violência e por um ambiente seguro e igualitário”;
“Defesa da Vida: pela proteção e preservação da vida das mulheres, em todas as suas dimensões, seja no trabalho, na saúde, na segurança, ou em situações de risco, promovendo políticas e ações que garantam a integridade das mulheres” e;
“Combate ao Assédio Moral no Local de Trabalho: Por um local de trabalho decente”.
Este último item é extremamente necessário até pelo número de denúncias que o MPT (Ministério Público do Trabalho) recebe, e a cada ano aumenta. Em 2022 foram 787 denúncias de violência ou assédio sexual; quase dobrou no ano seguinte: 1.437 e até 6 de março deste ano o número chegou a 241.
No mesmo período o órgão recebeu 65 denúncias de discriminação de gênero no trabalho, o que representa uma por dia. Em todo o ano de 2023 foram 417. No ano anterior (2022), o número foi bem menor: 269 no total.
A vice-coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho, a procuradora Danielle Olivares Corrêa, que atua no setor há quase 10 anos dos 15 anos em que trabalha como procuradora, conta que o combate a todo tipo de assédio no trabalho é uma das atuações mais importantes do MPT. Segundo ela, as situações de assédio moral envolvem homens e mulheres, mas que 99% dos assédios sexuais as vítimas são mulheres.
“Sempre existiram esses tipos de violência, mas agora eu acho que os trabalhadores estão mais informados, eles têm uma condição melhor de identificar a situação de violência pelas quais estão passando e sabem qual é o canal de denúncia que podem utilizar. Então, a gente acredita que a sensibilização social, quanto ao tema, ajuda a que entendam que eles estão passando por uma situação de assédio e recorram aos órgãos competentes de fiscalização e controle”, conta a procuradora.
É a partir das denúncias que o órgão pode abrir um inquérito civil, e acionar a empresa pedindo que ela tome providências por meio de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta).
“No TAC colocamos uma série de obrigações de fazer, e não fazer, da empresa para prevenir situações de assédio dentro do ambiente laboral. Por exemplo, que a empresa tenha uma gestão voltada ao combate à prática de toda forma de violência e assédio, treinamentos com funcionários para eles identificarem essa situação, criação de canais de denúncias internos dentro da empresa, em que se assegure o sigilo do denunciante; que de fato esse canal leve a um comitê gestor que possa fazer uma investigação e dar uma solução adequada para cada caso. A empresa que decide a penalidade ao assediador que pode ser, demissão, advertência ou suspensão. O que o MPT exige é que a empresa crie uma política de combate a toda forma de violência e assédio”, explica Danielle.
A procuradora cita como exemplos de assédio, que muitas vezes o trabalhador não identifica, as metas inalcançáveis e que ele pode fazer o trabalhador se sentir incompetente e até adoece por não conseguir atingi-las.
“São formas de assédio que precisam ser identificadas, e o trabalhador muitas vezes não faz a denúncia por medo de perder o emprego mesmo, mas o MPT recebe todo tipo de denúncia, inclusive, a anônima”, diz Danielle.
Ela recomenda que ao fazer a denúncia o trabalhador coloque todos os fatos ocorridos com o maior detalhamento possível; o setor que ocorreu; nomes dos assediadores, datas e a postura da empresa diante do fato.
“Os entes sindicais têm um papel muito importante nesse sentido de também colher essas denúncias e ajudar nas investigações para que a gente possa trabalhar em conjunto no combate a esse tipo de prática”, afirma.
Convenção Nº 190 da OIT
A OIT (Organização Mundial do Trabalho), estabeleceu novas normas globais com o objetivo de acabar com a violência e o assédio no mundo do trabalho. A Convenção de nº 190 da OIT é o primeiro tratado internacional a reconhecer o direito de todas as pessoas a um mundo de trabalho livre de violência e assédio, incluindo violência e assédio com base em gênero.
O Governo Lula (PT), enviou em março do ano passado, à Câmara dos Deputados o texto da Convenção 190 sobre a Eliminação da Violência e do Assédio no Mundo do Trabalho (MSC 86/23). O tratado só entra em vigor no Brasil após aprovação pelas duas Casas do Congresso Nacional. No entanto, a Convenção ainda não foi aprovada.
Para a secretária da Secretaria da Mulher Trabalhadora da CUT Nacional, Amanda Corcino, a lei só não foi aprovada porque temos um Congresso muito conservador.
“É preciso tramitar para que vire uma lei de fato, e a gente possa resguardar os trabalhadores e as trabalhadoras, principalmente da violência e do assédio dentro do ambiente de trabalho, para que não escale para outros tipos de violência também. Mas, infelizmente para o nosso Congresso isso não é prioridade”, lamenta a dirigente.
Empoderamento
A procuradora do MPT defende que as mulheres precisam se empoderar no sentido de não admitir nenhuma forma de desrespeito no ambiente de trabalho, e que elas podem fazer a denúncia para que o caso será investigado porque o respeito interpessoal, respeito pela mulher, ele tem que existir em todo lugar. Muito ainda mais dentro de uma empresa, onde a pessoa está trabalhando, está produzindo. Ela precisa ser respeitada como profissional e não ser vista como um objeto.
“A discriminação contra a mulher precisa ser combatida de todas as formas. É muito importante que quando a mulher se veja numa situação em que ela, a intimidade dela, por algum motivo foi violada por conta de uma situação abusiva, de assédio sexual, ela tem sim que fazer essa denúncia porque é através desse tipo de atitude que a gente vai combater esse tipo de prática”, diz, acrescentando o recado de que “meu recado às mulheres é para que elas se empoderem e denunciem quando se virem numa situação de violência e de afeto.
Por Rosely Rocha/CUT Nacional